Às margens
do Capibaribe eu sentei-me e chorei
Nasci
no século passado, melhor, no milênio passado. Mais exatamente em 1968. Janeiro
(dia 23) daquele ano. Muito provavelmente tomei meu primeiro banho com água tirada de uma cacimba cavada nas areias brancas
do leito seco desse importante rio de Pernambuco.
Ainda
guardo na memória o gosto da água. O gosto de areia. O gosto meio salobro. Água
limpa e pura. Minha casa ficava às margens do rio. Não distava 100 metros do
seu leito. Ficava no topo de uma ladeira. Mesmo perto do rio, a posição
colocava nossa casa em segurança contra as enchentes, naquela época, bem
freqüentes.
Acima
da nossa casa, aproximadamente uns 500 metros rio acima encontra-se a cachoeira
do Encantilado. Até meus vinte anos eu dormia embalado pelo barulho de suas
águas batendo nas pedras. Durante os dias, eu me deliciava com os banhos nas
suas águas. Nas águas barrentas e caudalosas no período de chuva, nas águas
claras dos poços na cachoeira do Encantilado ou nas águas tiradas das cacimbas.
Costumava também pescar. Aprendi a gostar de pescar nas águas do velho
Capibaribe. Ele nunca me negava algumas piabas. E como elas eram bem-vindas
naquela época.
Quando
precisei sair das margens do rio da minha vida, foi com bastante saudade que o
fiz. Deixei lá minha família e nunca mais voltei para lá morar. Mas depois de
peregrinar por algum tempo em terras paulistanas retornei para Pernambuco e vim
morar em Caruaru, onde resido desde 1992. Casei-me e gerei um filho, meu
pequeno Rafael, hoje com dois aninhos.
Com
certa freqüência, - bem menos do que gostaria - volto lá nas minhas antigas
moradas e visito o velho Capibaribe. Quantas mudanças ocorreram desde 1988
quando sair de lá! Uma das principais foi a construção da barragem de
Jucazinho. Por pouco as águas de sua represa não cobrem e a cachoeira do
Encantilado, visto que ela termina exatamente ao pé delas. E como Caruaru é abastecido também pelas
águas do Capibaribe, eu, que atualmente moro em Caruaru, continuo ligado ao
velho rio da minha vida.
Mas
a mais terrível mudança pela qual vem passando o rio Capibaribe é a que
presenciei neste último mês de março, quando visitei o meu velho rio pela
última vez. Era tempo ainda de seca, O inverno ainda não chegou e como já se
passaram mais de seis meses sem chuva na nossa região era para que o rio
estivesse seco. Era para que as cacimbas estivessem aparentes nas suas areias
brancas. Mas o que eu presenciei me deixou chocado. Pelo leito do rio ainda
corria um filete de água até que significativo. Fiquei chocado não somente por
isso. Pelo fato de o rio ter se tornado perene.
Mas por ver que aquela água cor de chá que corria ali nada mais era do
que água de esgoto. Água de esgoto
proveniente quase na sua totalidade das lavanderias instaladas nas localidades rio
acima, principalmente nas cidades de Toritama e Santa Cruz do Capibaribe.
Aquelas
águas cor de chá não são águas limpas como eu estava acostumado a ver nos fins
de período de verão… Naquelas águas limpas eu costumava tomar banho. Nestas,
cor de chá eu nem tive coragem de lavar os pés. Sentei-me nas pedras da cachoeira do
Encantilado e chorei. Chorei por ver seus poços cheios, convidativos para um
banho e totalmente impróprios para tal. Chorei por ver suas águas antes limpas,
agora escuras e venenosas. Chorei por quase não ver peixes onde antes havia
muitos.
É
preciso que sejam tomadas providências urgentes para que isso seja corrigido.
Não podemos nos esquecer que além de devolver o rio ao seu estado original de
limpeza e pureza de suas águas por uma questão de justiça ambiental, devemos
fazê-lo para que possamos ter águas limpas, afinal, aqui em Caruaru, estamos
bebendo daquelas águas e é na barragem de Jucazinho que está desaguando toda
aquela água poluída que vi.
Não
ignoro a importância econômica que o pólo têxtil da região trás para o nosso
povo tão sofrido por causa da constante instabilidade de nosso clima.
A
solução para a fixação do nosso povo na nossa terra tem sido esse tipo de
atividade e todas as outras atividades indiretas ligadas a ela.
Mas
nada disso justifica o que vi. É preciso que todos se conscientizem de que é
preciso que o progresso chegue mas também que se preserve a natureza e que
tenhamos água limpa porque precisamos dela para viver.
Autor: Djalma Alves Caruaru, 08 de abril de 2012
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